22/02/2010

IPO “As sombras do Hospital, também têm vida…”

Pressionei a caneta, tinha de escrever sobre…Dei um jeito à dor de costas e apliquei os sentidos em cima de algo…
Invisível é o coração quando tenta remediar as inflamações da nossa sede de cura.
Invisíveis são os passos e em viés são as mãos, que se abrem na tentativa de nos curar.
Os corredores estreitam a passagem da mente, as salas fornecem espaço e utensílios, que a mão humana usa. Os quartos gravam nas paredes o som das cicatrizes e libertam o odor da indisposição.
Espreitei uma porta e vi o enjoo, ainda era jovem tal dona, estava ligada a uma máquina, “quimioterapia” “radioterapia”, não o sei bem!
Andei mais um pouco…“faz-lhe bem andar!” Ora sorrindo, ora filtrando desconforto, falavam aquelas figuras de bata branca!
Ao fim do corredor altos berros indiciavam que mais alguém sofria…desviaram-me os olhos e encaminharam-me até outro lado. Entrei no elevador, subi e desci… Crianças, não é possível! Como foi que Deus se esqueceu delas? Porque é que a pretensa cura os horroriza?
Tenho de chegar rápido ao meu quarto, preciso de me ver…Tenho de apagar os nódulos mentais que avivam o meu receio!
Rodam as rodas da cama, a coberto do lençol um corpo se despede, resignado ou não, encosto-me às paredes e deixo-o ir…
Arrepio-me…tão sofrido cá cheguei, mas só me via! A minha dor parecia única, a mais autêntica!
Tão longe da verdade vão os nossos sentidos! Tão longe e tão nossa aquela dor, que como protecção aferrolha os nossos olhos!
Hoje sei que me vens visitar, pedia-te que me levasses daqui embora… mas não o faço, quero que me vejas num novo EU!
Anda cedo, preciso de partilhar contigo tudo o que puder… de uma vida quase mágica, que a cada passo nos empresta mais alguns segundos.


Carta de alguém que no meio de tantos regressou à vida dizendo… aqui retorno… com novas “ferramentas”, para cultivar pequenas flores de uma existência, feita de segundos…

4 comentários:

Graça disse...

Regressar à vida, porque cada segundo tem o sabor de uma eterna existência. Magnífico texto, querido Jorge... para ler nas sombras de todos nós.


Um beijo de imenso carinho.

Fá menor disse...

Tocante este texto...

um lado sofrido, um lado vivido, onde a vida se faz de segundos...
mas que de fora é difícil de avaliar.

Muita força para quem assim cultiva flores!

Bjos

Poemas e Cotidiano disse...

Muitas vezes fico a pensar como nos sentimos um "nada" em um Hospital. Eh colocar aquele avental e nos sentimos como qualquer pessoa desse mundo, como se a personalidade simplesmente desaparecesse e nos tornassemos apenas um amontoado de carne em cima de uma mesa. Isso nos faz pensar nao somente na brevidade da vida, mas tambem nao deixar o orgulho tomar conta de nossa cabeca.
Bonito e reflexivo seu texto.
Beijos
Mary

Poemas e Cotidiano disse...

"A minha dor parecia unica, a mais autentica"...

Lindo isso...muito verdadeiro.
Beijos
Mary

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