Leave me Alone
Porque as pessoas idosas são apenas os velhos do nosso abandono.
Para eles que somos nós no amanhã!
Negro Noturno
Os meus passos são como esmolas pedidas na avenida da Cavidade. Caminho clandestino num forçar de portas, sou eu e mais alguém desconhecidos da voz.
Estão rotos os meus sapatos de tanta caminhada em singela “homenagem” ao peregrino desconhecido. O tempo já quase não conta os quilómetros da estrada, avizinha-se tempestade, águas calmas ou nada.
Canto um destino aparvalhado na sorte e no azar da selva, onde são grandes estas vontades e pequenas estas Cidades.
Murmuro a solidão do riso em passadas perras de cansaço, de onde o recanto da rua levanta chama, que aquece as mãos do defeito, num jornal que cobre a minha mancha humana.
O que sobra são tonalidades de um negro nocturno, são candeias de azeite seco na minha torcida, que se mistura com o coma de jornada adormecida.
Mesmo ali, os bidões continuam a arder, ali eu queimo as minhas origens, ali eu faço derreter o perfume da minha descendência, que o “espírito” hipnotiza em golfadas de Botelha, estaladas nuns lábios ásperos da minha equimose vontade de chegar perto da querida saudade.
Sou velho com todas as letras, na senda do desmaio esqueci a dor do raio, a cor de Maio. Sou arcaico das minhas costas, sou a mensagem sem respostas. Ninguém me vê, sou apenas a sombra de uma pesada espécie, que de vez em quando recolhe a pena de ser “coitado” e logo adormece.
No lamento do gasto ser, continuo a caminhar pela última vez até o meu Sol escurecer. Aí paro de certeza. O pesado fardo da família e da sociedade fez-se em leveza. Mas não se entusiasmem demais, serei apenas um a menos a despejar de vós um pequeno pingo do vosso negrume, escondido por grossos óculos de estrume.
Nesse fim de rota não falsifiquem o choro, não sejam cínicos nesta instante, sejam apenas reais como o foram na hora do abandono. Porque o perdão não sou eu que o vou dar, nem poderia ressuscitar, e porquanto os pecados também foram meus. Ilibo-me dessa fumaça, já sou passagem livre pela praça, ergam bem alto a vossa taça, comemorem antes, o apogeu da vossa libertação da traça.
Este texto está no meu livro “Nas Linhas Das Tuas Mãos”
Jorge Vieira Cardoso
Ficção
Os meus passos são como esmolas pedidas na avenida da Cavidade. Caminho clandestino num forçar de portas, sou eu e mais alguém desconhecidos da voz.
Estão rotos os meus sapatos de tanta caminhada em singela “homenagem” ao peregrino desconhecido. O tempo já quase não conta os quilómetros da estrada, avizinha-se tempestade, águas calmas ou nada.
Canto um destino aparvalhado na sorte e no azar da selva, onde são grandes estas vontades e pequenas estas Cidades.
Murmuro a solidão do riso em passadas perras de cansaço, de onde o recanto da rua levanta chama, que aquece as mãos do defeito, num jornal que cobre a minha mancha humana.
O que sobra são tonalidades de um negro nocturno, são candeias de azeite seco na minha torcida, que se mistura com o coma de jornada adormecida.
Mesmo ali, os bidões continuam a arder, ali eu queimo as minhas origens, ali eu faço derreter o perfume da minha descendência, que o “espírito” hipnotiza em golfadas de Botelha, estaladas nuns lábios ásperos da minha equimose vontade de chegar perto da querida saudade.
Sou velho com todas as letras, na senda do desmaio esqueci a dor do raio, a cor de Maio. Sou arcaico das minhas costas, sou a mensagem sem respostas. Ninguém me vê, sou apenas a sombra de uma pesada espécie, que de vez em quando recolhe a pena de ser “coitado” e logo adormece.
No lamento do gasto ser, continuo a caminhar pela última vez até o meu Sol escurecer. Aí paro de certeza. O pesado fardo da família e da sociedade fez-se em leveza. Mas não se entusiasmem demais, serei apenas um a menos a despejar de vós um pequeno pingo do vosso negrume, escondido por grossos óculos de estrume.
Nesse fim de rota não falsifiquem o choro, não sejam cínicos nesta instante, sejam apenas reais como o foram na hora do abandono. Porque o perdão não sou eu que o vou dar, nem poderia ressuscitar, e porquanto os pecados também foram meus. Ilibo-me dessa fumaça, já sou passagem livre pela praça, ergam bem alto a vossa taça, comemorem antes, o apogeu da vossa libertação da traça.
Este texto está no meu livro “Nas Linhas Das Tuas Mãos”
Jorge Vieira Cardoso
Ficção